Profissionais se surpreendem com evolução de Igor Assis, primeiro paciente a tomar medicação importada para fibrose cística em Juiz de Fora

Igor Assis e Silva tem 18 anos e aos nove meses de idade, foi diagnosticado com Fibrose Cística. Ele tem estado presente nas redes sociais, onde produz conteúdo informativo sobre a doença e, recentemente, resolveu utilizar o alcance deste meio de comunicação para realizar uma vaquinha virtual. Com o sucesso deste recurso, ele é o primeiro paciente em Juiz de Fora a usar uma medicação importada (cada caixa custa em torno de R$ 20 mil, para uso por um mês), cuja esperança de resultado é lhe garantir uma qualidade de vida que ele nunca teve. Igor vive 24 horas no oxigênio e perdeu a conta de suas idas e vindas em internações hospitalares.

A Fibrose Cística faz parte do rol de doenças raras que podem ser identificadas no teste do pezinho, realizadoquando nasce um bebê. Também conhecida como Doença do Beijo Salgado ou Mucoviscidose é a doença genética letal mais comum da infância. Atinge cerca de 70 mil pessoas em todo mundo e afeta, principalmente, os pulmões, pâncreas e o sistema digestivo.

Uma vida de muita luta e resignação

Alessandra Silva de Assis e Silva, mãe de Igor, vive esta saga dia a dia ao lado do filho. Ela conta que a doença dele não foi descoberta no teste do pezinho porque naquela época essa triagem não era disponível. “A gente morava no Rio quando ele nasceu e com três meses, eu notei uma tosse persistente, ele não ganhava peso e numa ida ao hospital, ele foi diagnosticado com pneumonia e bronquiolite. Ficou 28 dias internado. 15 dias depois, começou tudo de novo, muita secreção respiratória, ele desnutrido e ninguém sugeria nada diferente. Aos 9 meses de idade, uma médica o tratou e, estranhando a falta de melhora com antibiótico, finalmente desconfiou de Fibrose Cística”, conta ela. Mais uma internação, nova intercorrência e ele acabou transferido para o Instituto Fernandes Figueira, que é referência na área. Quando o quadro permitiu, foi feito o teste do suor e confirmado o diagnóstico.

Igor, muito consciente de sua doença, informa que hoje, os melhores tratamentos são os moduladoresda proteína CFTR (sigla do Regulador de condutância Transmembrana da Fibrose Cística), e o que está tomando é um similar do remédio americano original – de origem argentina. O modulador CFTR liga-se à proteína defeituosa e, na superfície celular, abre o canal do íon Clorode forma que ele possa fluir, regulando a quantidade de água e íons na superfície da célula das glândulas exócrinas, no suor, intestinos e brônquios.

O paciente também foi o primeiro em Juiz de Fora a ganhar na justiça o direito de tomar esse novo medicamento, mas o caso ainda está sub judice. Igor conta que já foi indicado a transplante de pulmão bilateral, fez todos os exames e pesou prós e contras antes de entrar na fila para fazer o procedimento. Mas diante dos graves riscos, e de não ser essa uma solução definitiva, ele desistiu. “Acho muito invasivo e já perdi muitos amigos na mesma situação tentando este recurso. Por isso, preferi tentar a vaquinha, pois vendo todas as minhas funções físicas decaindo, acabei desenvolvendo um quadro de ansiedade e depressão e, por isso, preferi recorrer ao medicamento que tem bons resultados”, contou Igor, que passou pelo período de internação no Monte Sinai para receber as primeiras doses da medicação, visando ao monitoramento das reações das primeiras doses. Ele teve alta no último final de semana.

 Igor e a mãe com a equipe do Centro de Referência do HU e ao lado, ele com os médicos Marta Duarte e Vitor Alvim, no Monte Sinai

Cuidados especiais e esperança no futuro

O pediatra assistente de Igor no Monte Sinai, Dr. Vitor Alvim, o acompanhou diariamente nesta fase, pois ele recentemente teve piora da função pulmonar e desenvolveu uma complicação séria da doença, a Hemoptise (expectoração de sangue proveniente do trato respiratório). Ele precisou fazer uma embolização das artérias brônquicas, procedimento minimamente invasivo realizado no setor de Hemodinâmica do hospital por radiologista intervencionista. A pneumologista Dra. Marta Duarte, também do corpo clínico do Monte Sinai, é coordenadora do Centro de Referência em Fibrose Cística do Hospital Universitário da UFJF e acompanha Igor desde os 9 anos de idade, explica que a medicação pode provocar efeitos colaterais, por isso ele precisa ser medicado sob cuidados hospitalares, mas depois deverá tomar o medicamento de uso contínuo em casa e vai ser acompanhado ambulatorialmente.

Dra. Marta explica que nessa doença ocorre uma mutação genética, que resulta na produção de um muco mais espesso do que o normal nas glândulas do aparelho respiratório, essa secreção não é devidamente eliminada pelo corpo gerando infecções respiratórias repetidas de difícil controle pois as bactériasficam “protegidas” por esta secreção viscosa e isso dificulta a ação dos antibióticos, levando a diversas complicações. A Fibrose Cística é uma doença tipicamente de descendentes da raça caucasiana, existem muitos casos em países desenvolvidos como nos EUA, Europa e Austrália e, nesses locais as pesquisas farmacêuticas evoluíram e esses medicamentos estão sendo utilizados amplamentecom sucesso nesses países desde 2015. Como o Igor tem a mutação genética mais comum da doença, que afeta principalmente os pulmões e o pâncreas, a expectativa de resultado é bastante promissora. Ele pode passar a ter uma qualidade de vida muito melhor. Igor tem a esperança de que, usando a medicação por alguns meses, vai conseguir uma grande evolução que permitiráaguardar o outro medicamento que ainda espera conseguir via judicial, bem como obter o controle mais efetivo de sua enfermidade.

Igor e sua mãe são exemplos de luta, podem ajudar outras pessoas na mesma condição e sensibilizar autoridades para este problema. Dra. Marta destaca que um dos órgãos que a Fibrose Cística não afeta é o cérebro, portanto, os fibrocísticos são pessoas inteligentes que mantém suas funções cognitivas plenas. “Conheço estudantes e profissionais de Medicina, Odontologia, Fisioterapia e outras áreas que tem a doença e convivem com elasem que issoafete sua capacidade produtiva. Com o tratamento avançado com as novas drogas, essas pessoas poderão ter uma qualidade de vidamuito melhor e alcançarem sucesso na vida, por isso a luta do Igor pode beneficiar muita gente”.

Igor e a mãe no dia da alta com uma das equipes do andar em que passou as semanas de internação para tomar o Trixacar e procedimentos anteriores

Evolução surpreendente

A fisioterapeuta Edilaine Maciel, que acompanhou a evolução de Igor nesta internação, como em inúmeras outras anteriores, sem o remédio, até se emociona com o resultado: “ver a evolução do Igor é uma felicidade inexplicável, a vitória dele é a nossa. A chegada da nova medicação trouxe esperança, e como se ele estivesse renascendo é sinal de vida nova esperança”, ressalta ela. Edilaine diz que, há anos cuidando de pacientes com Fibrose Cística, este era um momento muito esperado, o momento que viria uma medicação nova e com ela a vida. “Depois de anos limitado, dependente de oxigênio 24 horas chegou a hora do Igor, quando ele vai poder ser livre, realizar as atividades que sempre teve vontade como jogar bola com os amigos. Igor, hoje, está com uma capacidade funcional do pulmão melhor, já consegue realizar exercícios de resistência e aeróbicos, os quais não conseguia antes da medicação, e eu estou imensamente feliz por ter a oportunidade de participar desse momento, vibro com cada conquista, com cada exercício realizado sem muito sacrifício, vibro por ele conseguir realizar suas atividades como ir ao banheiro sem oxigênio, pequenas coisas que antes eram impossíveis de ser realizadas. Viva a vida viva a ciência!”

A primeira coisa que Igor postou em suas redes, logo após chegar em casa após esta internação, foi um breve relato de como era sua rotina antes e dizer “agora estou tendo a sensação de viver normalmente, acordando disposto, sem tosses, e essa tem sai a melhor situação da minha vida. Eu sempre vivi por esse tratamento, deixei de realizar vários objetivos, por conta dessa doença”.